Guia de Fitoterápicos – Capsúlas
Guia de Fitoterápicos – Capsúlas

As plantas são “laboratórios vivos” que suprem nossas necessidades metabólicas, seja nos fornecendo oxigênio, nutrientes essenciais ou uma química refinada capaz de nos trazer alívio ou curar enfermidades. A história da medicina nos mostra que a produção de medicamentos e o tratamento farmacológico de doenças começaram com o uso de plantas medicinais. A ciência moderna, tal qual o médico grego Dioscorides no século I d.C., ainda “recolhe as ervas do caminho” em busca de um modelo molecular capaz de interagir com receptores celulares de forma a desencadear respostas fisiológicas benéficas em doenças desafiadoras como câncer, diabetes, esclerose múltipla ou mal de Alzheimer. Uma parte significativa de todos os medicamentos usados atualmente é derivada direta ou indiretamente, de princípios ativos que foram isolados de plantas. E as modernas tecnologias de modelagem molecular ainda buscam no metabolismo secundário vegetal os medicamentos do futuro.

O rigor científico atual muitas vezes se contrapõe ao uso tradicional, popular, das ervas medicinais, assim a fitoterapia foi relegada ao plano de uma modalidade alternativa. Entretanto, seria correto classificar a fitoterapia como um ramo da medicina quando consideramos que a história da fitoterapia clássica atravessa mais de 2000 anos e que muitas plantas medicinais usadas durante todo este período, não apenas têm ações específicas, como também estão livres de efeitos colaterais perigosos.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) classifica a fitoterapia como uma prática integrativa e complementar sedimentada pela Medicina Tradicional dos vários povos e preconiza sua utilização como um recurso de saúde pública mundial desde que cada país estabeleça sua Política de Integração da Fitoterapia assim como, as regras de segurança, eficácia, qualidade, acesso, e uso racional. No Brasil, em consonância com as recomendações da OMS, foi aprovada, em 2006, a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS (PNPIC), contemplando, entre outras, diretrizes e responsabilidades institucionais para implantação/adequação de ações e serviços de medicina tradicional chinesa/acupuntura, homeopatia, plantas medicinais e fitoterapia no Sistema Único de Saúde (SUS).

A fitoterapia é uma prática terapêutica que pode ser utilizada como primeira escolha e/ou de forma complementar, sempre sob a orientação de um profissional da saúde, com finalidade profilática, paleativa e/ou curativa. As plantas só devem ser consumidas dentro de um esquema terapêutico em plena observância da dose utilizada, frequência de uso, via de administração, forma de preparação e tempo de utilização, pois os fitoterápicos não estãoisentos de toxicidade, como qualquer medicamento, e há evidências bibliográficas de reações adversas, precauções necessárias e interações medicamentosas. Ainda assim, a tolerância aos fitoterápicos é em geral maior se comparada aos fármacos.

        

    

Quando deve-se ou pode-se prescrever fitoterapia?

    

        

            

Fintelmann & Weiss (2010) classificam os fitoterápicos que estariam disponíveis para uma prescrição em categorias terapêuticas, uma interessante orientação para guiar a decisão clínica e que ajuda a esclarecer as possibilidades (ou não) de tratamento fitoterápico exclusivo ou combinado. Categorias terapêuticas para fitoterápicos:

Categoria 1 – Indicações para as quais os fitoterápicos são a opção terapêutica de 1ª escolha e, para as quais, como alternativa, não existiriam medicamentos sintéticos. Exs.: hepatites tóxicas, hiperplasia benigna de próstata, entre outros.

Categoria 2 – Indicações para as quais os medicamentos sintéticos podem ser substituídos por fitoterápicos. Exs.: estados leves de ansiedade e/ou depressão reativa, dispepsia não ulcerosa neoplásica, infecções urinárias inespecíficas, entre outros.

Categoria 3 – Indicações nas quais os fitoterápicos podem ser usados como coadjuvantes para uma terapia básica. Exs.: outras doenças hepáticas e das vias respiratórias, entre outras.

Categoria 4 – Indicações nas quais o uso dos fitoterápicos não é adequado, caracterizando até mesmo erro médico, pela possibilidade de retardar ou impedir uma terapia racional com medicamentos sintéticos, mais adequados. Ex.: tratamento primário do câncer

Realmente prescrever fitoterapia não é simples, pois esse campo do conhecimento ainda é marginalizado e negligenciado no ensino universitário. Os profissionais de saúde adeptos dela obrigam-se a uma contínua atualização em novos livros e nas bases de dados de maneira a adaptar certo arsenal de plantas medicinais e fitoterápicos de domínio técnico em sua rotina de trabalho. Tal hábito lhes confere maior segurança ao propor (ou aceitar) escolhas terapêuticas que incluam fitoterápicos. Outro ponto a ser valorizado é na Saúde da Família, na qual a fitoterapia pode assumir caráter preventivo, como intervenção em predisposições familiares e constitucionais, e junto às condições patológicas ainda em sua fase incipiente (FINTELMANN; WEISS, 2010).

        

    

FITOTERAPIA E EPIGENÉTICA

    

        

            

A informação genética de um organismo está codificada na sequência de DNA que é geralmente fixada e não pode ser alterada rapidamente em resposta a um estímulo externo, mas a expressão de genes é regulada. Nos últimos anos, a relação profunda entre o metabolismo celular e a regulação epigenética tem sido cada vez mais estudada. No entanto, estamos apenas começando a entender como a dieta e a nutrição, principalmente uso das plantas impactam a saúde humana por meio de processos epigenéticos e o papel que o metabolismo desempenha em várias doenças por meio da regulação e herança do gene epigenético. A epigenética é uma ciência relativamente jovem, faz parte das chamadas tecnologias OMIC (nutrigenômica, proteômica, metabolômica) e investiga aquelas alterações hereditárias na expressão gênica, em outros termos definidos como “fenótipo”, que ocorrem sem alterações nas sequências de DNA e eles são poderosos o suficiente para regular a dinâmica da expressão gênica.

Algumas moléculas de origem vegetal influenciam a expressão de nosso material genético sem alterar o DNA é o efeito “epigenético, ou seja, modulam a expressão gênica por meio de vários mecanismos de ação, e assim desencadeiam atividades desintoxicantes e antioxidantes ou alteraram o metabolismo hormonal e modulam eventos celulares. As modificações epigenéticas são potencialmente reversíveis. Os principais processos responsáveis pela regulação epigenética são a inibição da metilação do DNA, modificações da cromatina (modificação covalente das histonas) e regulação do gene pós-transcricional por RNA não codificante (micro-RNA). As substâncias de origem vegetal que  demonstram maior interesse neste campo são os polifenóis do chá, genisteína (de soja, etc.), curcumina, sulforafano, fenil isotiocianato e indol-3-carbinol ( da família dos brócolis e repolho em geral), licopeno (do tomate etc.), resveratrol (das uvas etc.), quercetina (das alcaparras etc.) Ressalte-se que são substâncias presentes em vegetais, frutas e temperos comuns em nossa alimentação. Estudos recentes demonstraram que a nutrição e a fitoterapia, podem ser úteis para proteger o corpo do estresse oxidativo e agir na prevenção e tratamento de doenças metabólicas, incluindo diabetes ou obesidade, e também as doenças inflamatórias crônicas e certos tipos de câncer.

        

    

FITOTERÁPICOS EM CÁPSULAS: GUIA PARA CONSULTA RÁPIDA

    

        

            

Considerando o uso terapêutico tradicional das plantas, os atuais conhecimentos científicos sobre a fitoquímica e epigenética, o uso racional de fitoterapia pode ser incorporado nas práticas diárias de promoção da saúde. Assim, a Homeoterápica Farmácia de Manipulação dentro dos preceitos da assistência farmacêutica, que é o conjunto de ações voltadas à promoção, proteção e recuperação da saúde, propõe uma ação para auxiliar as equipes multidisciplinaresde profissionais de saúde bem como os usuários, divulgandooGuia para Consulta Rápida de Fitoterápicos em Cápsulas. A forma farmacêutica sólida, cápsulas, no contexto da farmacotécnica apresenta maior estabilidade física e química e também uma maior possibilidade de padronização de ativos e resultados terapêuticos.

Para melhor compreender os elementos que compõem este Guia será necessário definir alguns conceitos:

– Planta medicinal: espécie vegetal, cultivada ou não, com propósitos terapêuticos

– Fitoterápico: produto obtido da planta medicinal ou de seus derivados, exceto substâncias isoladas, com finalidade profilática, curativa ou paliativa.

– Medicamentos Fitoterápicos: são produtos tecnicamente elaborados obtidos com emprego exclusivo de matérias-primas ativas vegetais cuja segurança e eficácia sejam baseadas em evidências clínicas e que sejam caracterizados pela constância de sua qualidade.

– Planta seca (droga vegetal)- droga vegetal é a planta medicinal (ou suas partes) que contenha as substâncias, ou classes de substâncias, responsáveis pela ação terapêutica, após processos de coleta ou colheita, estabilização, secagem, podendo ser íntegra, rasurada ou triturada

– Fitoterápico Manipulado – os fitoterápicos são manipulados por farmácias  de manipulação de acordo com a legislação vigente e devem atender aos requisitos de boas práticas de manipulação, de acordo com as exigências sanitárias. A matéria-prima vegetal, utilizada na manipulação do fitoterápico, deve ser processada de acordo com as boas práticas, oriunda de hortos/hortas oficiais e/ou de produtores com alvará ou licença de órgão competente para tal.Enquanto que os derivados vegetais devem ser processados de acordo com as boas práticas de fabricação, oriundos de fornecedores com alvará ou licença de órgão competente par

– Formas sólidas – as formas farmacêuticas sólidas têm em comum a maior estabilidade física, química e microbiológica que as demais formas, mas são bastante susceptíveis do ponto de vista biofarmacêutico, exigindo grande cuidado na escolha e quantidade dos excipientes utilizados na sua fabricação

– Pó da planta – É a forma farmacêutica obtida após a estabilização, secagem, trituração e tamisação da droga. O envase e armazenamento devem ser realizados de forma a evitar a absorção de umidade, contaminação com outras espécies e exposição à luz solar. Para a preparação dessa forma, a espécie vegetal ou a parte que contém o metabólito secundário selecionado deve ser submetida a um conjunto de operações farmacêuticas visando a sua estabilização química e microbiológica, à redução da umidade por meio da dessecação em temperatura ambiente ou em estufa com controle de temperatura e circulação de ar. Dependendo da parte da planta, pode ser necessário realizar redução inicial do tamanho, como nos tubérculos e cascas, de forma a facilitar a difusão da água e redução da umidade. Depois da secagem, será realizada a trituração propriamente dita. Não se deve confundir o pó com o extrato seco.

– Extratos secos– São preparações sólidas, também de forma pulverulenta, mas é obtido por um processo extrativo como percolação, maceração ou outro método adequado e validado, utilizando como solvente etanol, água ou outro solvente adequado.  O solvente utilizado na preparação é evaporado e os extratos secos, no mínimo, 95% de resíduo seco, calculados como porcentagem de massa. Os extratos secos padronizados têm o teor deseus constituintes ajustado pela adição de materiais inertes adequados ou pela adição de extratos secos obtidos com a mesma droga utilizada na preparação.

– Cápsulas – é a forma farmacêutica obtida pela deposição ordenada da droga seca (pó), triturada e tamisada ou de extratos secos em cápsulas gelatinosas duras, Os invólucros utilizados são geralmente de natureza proteica (gelatina) ou cápsulas duras preparadas com derivados celulósicos. Cuidado especial deve ser tomado com a umidade, temperatura e pressão exercida sobre as cápsulas durante o armazenamento e transporte. Esses fatores podem desidratar ou hidratar as cápsulas, tornando-as quebradiças ou deformadas e coladas, respectivamente.

Principais interações de fitoterápicos com medicamentos :

Hipérico (Hypericum perforatum) – se utilizada juntamente a anticoncepcionais, pode causar a diminuição do efeito do anticoncepcional e levar à gravidez.

Ginco (Ginko biloba) junto a anticoagulantes, como warfarina ou ácido acetilsalicílico, que pode potencializar os efeitos anticoagulantes e causar hemorragias.

Precauções com a fitoterapia – os cuidados que se deve ter ao utilizar um fitoterápico são os mesmos destinados aos demais medicamentos:

– Buscar informações sobre o medicamento com os profissionais de saúde;

– Informar o seu médico sobre qualquer reação desagradável que aconteça enquanto estiver usando plantas medicinais ou fitoterápicos;

– Observar cuidados especiais com gestantes, mulheres em fase de amamentação, crianças e idosos;

– Informar o seu médico se está utilizando plantas medicinais ou fitoterápicos, principalmente antes de cirurgias;

– Adquirir fitoterápicos apenas em farmácias e drogarias autorizadas pela vigilância sanitária;

– Seguir as orientações da bula e rotulagem;

– Observar a data de validade – nunca tomar medicamentos vencidos;

– Seguir corretamente os cuidados de armazenamento; e

– Desconfiar de produtos que prometem curas milagrosas ou para várias diferentes doenças.

Fitoterápicos e Farmácia de Manipulação: As farmácias de manipulação têm permissão para manipular medicamentos e, dentre eles, os fitoterápicos.Um fitoterápico só poderá ser manipulado se for prescrito em uma receita por profissional habilitado (manipulação magistral) ou se sua fórmula constar no Formulário de Fitoterápicos da Farmacopeia Brasileira (manipulação oficinal).

Referências Bibliográficas:

  1. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS, PNPIC, SUS. Brasília: Ministério da Saúde, 2006. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pnpic.pdf

  2. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Práticas integrativas e complementares: plantas medicinais e fitoterapia na Atenção Básica/Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. – Brasília : Ministério da Saúde, 2012. 156 p. : il. – (Série A. Normas e Manuais Técnicos) (Cadernos de Atenção Básica ; n. 31) http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/praticas_integrativas_complementares_plantas_medicinais_cab31.pdf

  3. FINTELMANN, V.; WEISS, R. F. Manual de fitoterapia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010, 526 p.

  4. RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA – RDC N° 26, DE 13 DE MAIO DE 2014 Dispõe sobre o registro de medicamentos fitoterápicos e o registro e a notificação de produtos tradicionais fitoterápicos. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2014/rdc0026_13_05_2014.pdf

  5. ANVISA – Primeiro Suplemento do Formulário de Fitoterápicos da Farmacopeia Brasileira (publicado em 10/05/2018) http://portal.anvisa.gov.br/documents/33832/259456/Suplemento+FFFB.pdf/478d1f83-7a0d-48aa-9815-37dbc6b29f9a

  6. BARTKE, T. and SCHNEIDER, R.You are what you eat – How nutrition and metabolism shape the genome through epigenetics. Molecular Metabolism, August 2020. https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2212877820300612?via%3Dihub